Em maio, a Câmara dos Deputados concluiu a análise do Projeto de Lei (PL) 3729/2004 que propõe a criação de um novo marco legal para o processo de Licenciamento Ambiental, atualmente previsto na lei 6938/1980, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente. A matéria seguiu para a análise do Senado Federal.
Em março de 2021, o deputado Neri Geller (PP/MT) foi designado relator de plenário da matéria e apresentou seu relatório em 10/05. O Plenário da Casa concluiu a análise do texto três dias depois, em 13/05, e recebeu 300 votos favoráveis e 122 contrários.
A proposição faz parte da agenda legislativa prioritária anunciada pelo governo Bolsonaro para 2021. Ademais, o texto aprovado possui o apoio da Frente Parlamentar da Agropecuária, grupo que constitui parte da base de apoio governista e que é próximo do presidente da Casa, deputado Arthur Lira (PP/AL). A revisão das regras sobre o licenciamento ambiental também é apoiada pela Confederação Nacional da Indústria.
Câmara dos Deputados
Os dois meses entre a designação do deputado Neri Geller como relator do projeto e a aprovação da matéria pelo plenário contrastam com os quase 17 anos de tramitação da matéria na Câmara dos Deputados. Desde sua apresentação em 2004, o PL foi objeto de diversas discussões e articulações que resultaram em algumas propostas de pareceres apresentados e, em 2016, passou a tramitar em regime de urgência, o que o levou para análise direta do Plenário.
Nos últimos 2 anos, o PL era debatido por Grupo de Trabalho (GT) coordenado pelo deputado Kim Kataguiri (DEM/SP). Apesar de não possuir competência para aprovar ou rejeitar o PL, o GT tinha o objetivo de contribuir para a construção um texto minimamente consensual que pudesse ser submetido ao Plenário da Câmara. Assim, o deputado Kim Kataguiri chegou a apresentar 4 versões do texto-base durante 2019. A 4ª e última versão publicada, apresentada em agosto, foi alvo de críticas de entidades e parlamentares ambientalistas, pois consideravam que a proposta trazia retrocessos e graves flexibilizações no processo de licenciamento.
Kataguiri indicou que apresentaria uma 5ª versão do parecer em 2020, mas o texto não foi publicado. O parlamentar afirmou que estava nas fases finais das negociações e que tinha avançado nos seguintes temas: padronização de conceitos; classificação dos tipos de licenciamento previstos; digitalização e transparência do processo; definição de padrões de condicionantes e proporcionalidade de compensações ambientais. O deputado Rodrigo Agostinho (PSB/SP), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, reiterou que o texto estava em estágio avançado e englobava alguns dos principais pontos controversos, como: Avaliação Ambiental Estratégica; Zoneamento Econômico-Ecológico; unificação de fases; Licença por Adesão e Compromisso; e simplificação de processos para o setor de saneamento.
Ainda em 2020, o então presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM/RJ) sinalizou a possibilidade de pautar o projeto em Plenário, mas acabou não dando andamento ao processo.
Em março de 2021, o deputado Neri Geller (PP/MT) foi designado o novo relator da matéria. Ele é vice-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) e integrou o GT que estava discutindo o projeto. Nessa oportunidade, Geller reconheceu o trabalho desenvolvido por Kim Kataguiri e afirmou que utilizaria o texto desenvolvido por esse parlamentar como base de seu relatório. Assim, o relator iniciou uma série de conversas com autoridades do Poder Executivo e parlamentares e anunciou que sua intenção era pautar o tema nos próximos 90 dias.
Essa previsão foi cumprida e seu relatório foi aprovado pelo Plenário dois meses após sua designação como relator da matéria. O texto-base do PL 3729/2004 foi aprovado em Plenário por 300 votos favoráveis a 122 votos contrários, em uma sessão que se estendeu até a madrugada. Na manhã seguinte, o Plenário dedicou outra sessão à análise dos destaques apresentados. Com a retirada ou rejeição de todos os destaques, porém, o texto principal foi mantido, na forma do substitutivo apresentado pelo deputado Neri Geller, e, novamente por 300 votos a 122, a redação final foi aprovada.
Ao proferir seu parecer, o deputado destacou que o projeto irá garantir segurança jurídica e desbloquear investimentos no país. Afirmou, ainda, que o substitutivo foi estruturado com base no texto apresentado pelo deputado Kim Kataguiri (DEM/SP) após debates dentro do Grupo de Trabalho Licenciamento Ambiental. O substitutivo, segundo Neri Geller, estabelece diretrizes uniformes adaptáveis às especificidades de cada região e respeita a autonomia dos entes federativos. O deputado reiterou que o projeto aprimora a participação da sociedade civil na fase de elaboração dos termos de referência, concentra o poder decisório no órgão licenciador e promove a adoção de meios eletrônicos e de procedimentos simplificados, além de prever a dispensa do licenciamento para 13 atividades. Neri Geller frisou que o texto não abre qualquer precedente para supressão de vegetação nativa.
Senado Federal
Um mês após sua aprovação na Câmara, o projeto foi recebido pelo Senado Federal e numerado como Projeto de Lei (PL) 2159/2021. A demora no recebimento pode ser atribuída a embates políticos acerca do despacho e da relatoria da matéria, mediados pelo Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM/MG).
Inicialmente, o texto chegou a ser remetido diretamente para análise do Plenário, onde a senadora Katia Abreu (PP/TO) foi designada relatora. Contudo, após reunião com os Presidentes das Comissões de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), de Meio Ambiente (CMA) e de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) (Acir Gurgacz, Jaques Wagner e Kátia Abreu), o senador Rodrigo Pacheco anunciou a revisão do despacho da matéria, que passou a tramitar simultaneamente na CMA e CRA e, somente após a deliberação pelas comissões, deverá ser submetida ao Plenário. As comissões deverão organizar reuniões conjuntas para o aprofundamento e o aprimoramento do projeto.
Já foi aprovado, inclusive, requerimento de audiência pública conjunta entre CMA e CRA para debater sobre licenciamento. A expectativa é de que sejam realizadas 3 audiências sobre o tema no mês de setembro.
Destaca-se, ainda, que a senadora Kátia Abreu foi novamente designada relatora, tanto na CRA como na CMA. A senadora tem sido incisiva quanto a importância da questão ambiental para o país, destacando o risco de o Brasil não prosperar em acordos comerciais caso não trate o tema com a atenção devida. A relatora informou que vai buscar consenso sobre o texto, ouvindo especialistas sobre o tema.
Perspectivas
A prioridade atribuída à pauta pelo governo e a proximidade da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) com o presidente da Câmara contribuíram para o avanço da matéria. Essa movimentação foi questionada em documento assinado por cerca de 250 organizações da sociedade civil que solicitava aos presidentes da Câmara e do Senado que concentrassem esforços no enfrentamento da pandemia de Covid-19 e evitassem pautar propostas legislativas controversas.
A rápida aprovação do projeto no Plenário da Câmara e a falta de espaço para diálogo foram pontos duramente criticados por parlamentares da oposição, além de organizações, entidades científicas e sociedade civil que, apesar de concordarem com a necessidade de otimização do processo de licenciamento ambiental, fazem ressalvas e cobram alterações em pontos do texto agora em análise pelo Senado Federal. Da mesma forma, o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), rede que reúne 60 grupos empresariais, declarou preocupação com a aprovação do projeto na Câmara, pontuando a possibilidade de piora da reputação do Brasil no exterior.
Houve forte pressão, portanto, para que o Senado Federal aprofundasse o debate. Nesse viés, Rodrigo Pacheco, que havia decidido deliberar o projeto diretamente no plenário da Casa, voltou atrás. Ao anunciar a revisão do despacho, o presidente do Senado destacou o compromisso da Casa com o desenvolvimento econômico, com o agronegócio do país, mas também com a sustentabilidade e com a preservação do meio ambiente. Segundo Pacheco, a tramitação do projeto pelas comissões será uma oportunidade para ouvir a sociedade civil e especialistas, para que o tema seja estudado com profundidade.
Como mencionado, já houve a aprovação do Requerimento (REQ) 6/2021, de autoria do senador Acir Gurgacz (PDT/RO), para realização de audiências públicas conjuntas sobre o tema. Assim, a tramitação do projeto ficará sobrestada até a realização dos debates.
Para além da realização das audiências, aguarda-se a apresentação de parecer pela relatora, senadora Kátia Abreu. Vale salientar que, ainda que a matéria tramite de forma concomitante na CRA e na CMA, o parecer deve ser aprovado em cada comissão para então seguir para a apreciação do Plenário.
Esse artigo é atualizado à medida que acontecem movimentações relevantes relacionadas ao tema. Sua publicação ocorreu em 01/04/2021 e a última atualização em 26/08/2021.
Elaborado pela Equipe da Umbelino Lôbo: Gabriela Barbagalo, assessora.