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Pandemia e a Vacinação no Brasil

Desde março de 2020, a pandemia tem pautado as discussões e a agenda política pelo mundo. No Brasil não foi diferente. No ano passado, os governos federais, estaduais e municipais, bem como o Congresso Nacional, desenvolveram medidas para evitar a propagação da covid e minimizar os seus efeitos econômicos. Em 2021, com o início da vacinação, os esforços se concentram na ampliação da oferta dos imunizantes. Assim, esse artigo apresenta um panorama da pandemia no Brasil, especialmente considerando o ano de 2021, o processo de vacinação e a nova gestão do Ministério da Saúde, a partir de março de 2021, com a nomeação de Marcelo Queiroga.  

Pandemia no Brasil

Nas últimas semanas, as taxas de ocupação de leitos de UTI Covid-19 para adultos no Sistema Único de Saúde (SUS) e os índices de mortalidade caíram. Na última semana, pela primeira vez desde o início de dezembro de 2020, nenhum estado apresenta taxa de ocupação de leitos superior a 90%. Porém, a taxa de transmissão está em alta e em patamar muito superior ao observado em meados de 2020. Após mais de um ano da declaração de pandemia, as medidas de isolamento social possuem cada vez menos engajamento e a vacinação ganha ainda mais importância no combate à doença. Com a vacinação, o número de óbitos e internações diminui entre os grupos de risco ou grupos prioritários. Ao mesmo tempo, a transmissão permanece intensa entres aqueles que ainda não foram imunizados.

Vacinação

A vacinação no Brasil começou em ritmo lento e enfrentou resistências do próprio governo para avançar. O primeiro semestre de vacinação foi marcado por discussões de propostas legislativas relacionadas ao processo de vacinação, por mudanças no comando do Ministério da Saúde, por dificuldades na importação de insumos para as vacinas e negociações para adiantar doses contratadas para a segunda metade de 2021.

Mesmo com essas dificuldades, ainda presentes, o Brasil encerrou o mês de junho ultrapassando a marca de 100 milhões de vacinas aplicadas. O Ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirma que até setembro toda a população brasileira acima de 18 anos terá recebido uma dose de vacina e até o fim do ano, as duas doses.

Para atingir essa meta, é necessário triplicar a quantidade de doses do que já foi aplicado até o momento. De acordo com as informações do Ministério da Saúde, essa quantidade de doses já estaria garantida. Se os laboratórios cumprirem os prazos acordados com o órgão, em dezembro sobrarão mais de 300 milhões de doses. Até lá, é possível que seja preciso vacinar os adolescentes entre 12 e 18 anos, dar uma dose de reforço a idosos e profissionais de saúde ou mesmo guardar doses para 2022.

Por outro lado, o Brasil segue como segundo país no mundo em número de mortes, atrás apenas dos Estados Unidos. Já em número de contaminações, o Brasil ocupa a terceira colocação no ranking mundial, atrás dos Estados Unidos e a Índia. Em âmbito nacional, seis estados brasileiros ultrapassaram a marca de 1 milhão de contaminações: São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraná, Bahia e Santa Catarina.

As projeções de entregas de vacina podem ser encontradas nesse link atualizado semanalmente pelo Ministério da Saúde.

Nessa página, é possível acompanhar os dados relacionados ao processo de vacinação.

Poder Executivo

A gestão da pandemia por parte do governo federal é marcada por polarizações e desencontros sobre medidas de prevenção e vacinação. Em 2020, o presidente Jair Bolsonaro minimizou a gravidade da doença e criticou prefeitos e governadores por adotarem medidas de isolamento social, defendendo que os prejuízos econômicos resultantes dessas medidas seriam superiores aos danos que a doença poderia causar. Além disso, o presidente passou a defender teses como a “imunidade de rebanho” e o “tratamento precoce”.

Em 2021, a pandemia no país alcançou níveis ainda mais graves, com episódios de colapso do sistema de saúde como ocorreu em fevereiro em Manaus. Esse cenário, somado a dificuldades de avanço da vacinação, colocou o governo em uma situação de fortes críticas e insatisfação popular.

Para tentar amenizar a situação, o governo alterou estratégias no combate à pandemia. O presidente passou a se pronunciar menos e Eduardo Pazuello deixou o comando do Ministério da Saúde, e deu lugar a Marcelo Queiroga, médico e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia. O nome foi bem aceito, especialmente pelo Poder Legislativo, que confiou que o novo ministro marcaria uma nova fase na pasta, voltada para a ampliação da vacinação.

O presidente, por outro lado, oscila entre momentos de poucos pronunciamentos e declarações controversas. No último mês, por exemplo, voltou a defender que a contaminação pelo coronavírus seria mais eficaz que as vacinas contra a doença. Também foram realizadas declarações contrárias à China, país responsável pelo envio de insumos necessários para a fabricação de vacinas, e contrárias à eficácia da Coronavac.

Ministério da Saúde

Desde a sua nomeação, Marcelo Queiroga tem priorizado o combate à pandemia e a ampliação da campanha de vacinação, mas aparenta enfrentar obstáculos ideológicos e questões relacionadas à gestão anterior da pasta.

O ministro criou a Secretaria Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19 para concentrar os esforços de combate à pandemia. Porém a nomeação da dirigente para a nova secretaria foi alvo de divergências. Inicialmente, Queiroga havia anunciado a médica infectologista Luana Araújo como titular da Secretaria Extraordinária. Porém, a nomeação não se concretizou e foi ventilado que a razão estaria relacionada à crítica da médica ao tratamento precoce defendido pelo presidente.

Mais recentemente, o ministro teve que lidar com as repercussões de denúncias relacionadas ao contrato de compra da vacina Covaxin, assinado em fevereiro, prevendo a importação de 20 milhões de doses do imunizante, desenvolvido pela indiana Bharat Biotech. As doses nunca chegaram a ser enviadas ao Brasil, uma vez que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) negou seguidos pedidos de importação do imunizante, pois não atendia aos critérios técnicos. Após as denúncias, o ministro decidiu suspender a negociação.

Poder Legislativo

Em 2020, as pautas do Poder Legislativo giraram em torno da pandemia. Foram aprovadas medidas como o auxílio emergencial, orçamento para combate da doença e medidas econômicas e setoriais para minimizar os efeitos da covid no país.

Em 2021, o combate à pandemia permaneceu no foco do Congresso, voltado especialmente para a questão da vacinação. Observando as dificuldades de avanço das campanhas foram apresentadas diversas propostas que objetivavam contribuir para acelerar a vacinação. Destacam-se a seguir as principais discussões e projetos no âmbito do Poder Legislativo durante o primeiro semestre:

Responsabilidade civil

De autoria do Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM/MG), o Congresso aprovou em março o Projeto de Lei (PL) 534/2021, que dispõe sobre a responsabilidade civil relativa a eventos adversos pós-vacinação contra covid-19 e sobre a aquisição e comercialização de vacinas por pessoas jurídicas de direito privado. Sancionada na forma da Lei nº 14.125, de 10 de março de 2021, garante, entre outras medidas, segurança jurídica aos laboratórios em caso de atraso na entrega ou de eventuais efeitos colaterais do imunizante.

Aquisição de vacinas pela iniciativa privada

Após a sanção Lei nº 14.125, o deputado Hildo Rocha (MDB/MA) apresentou o PL 948/2021, que permite à iniciativa privada comprar vacinas contra a covid-19 para a imunização gratuita de seus empregados, desde que seja doada a mesma quantidade ao SUS. Pela lei vigente, é preciso esperar o programa público vacinar todos os grupos prioritários definidos pelo Ministério da Saúde. Após uma rápida tramitação na Câmara dos Deputados e contando com o apoio de parte do setor empresarial, o projeto de lei chegou ao Senado no dia 8 de abril. Porém, desde então não entrou na pauta de votação.

A proposta divide opiniões. Enquanto seus defensores alegam que o projeto ajudaria a agilizar a imunização em massa da população, aqueles que são contrários defendem que a proposta institucionaliza a vacinação de grupos com maior poder econômico. 

Indústria veterinária

Com o objetivo de ampliar a produção das vacinas em território nacional, o senador Wellington Fagundes (PL/MT) apresentou o PL 1343/2021, que permite que estabelecimentos que fabricam produtos de uso veterinário sejam temporariamente autorizados a produzir vacinas contra a covid-19. A matéria aguarda deliberação do Senado sobre as alterações da Câmara, para então seguir para a sanção. 

Patentes

Também com o objetivo de ampliar a produção de vacinas, diversos projetos foram apresentados para tratar da possibilidade de licença compulsória de patentes de vacinas e insumos de combate à pandemia. O tema também divide opiniões, dentro e fora do Congresso. Contrários à quebra de patentes defendem que a mudança poderia resultar em insegurança jurídica e desincentivo à investimentos, além da dificuldade em internalização da tecnologia da vacina. Aqueles favoráveis acreditam que a quebra seria uma saída para ampliar a produção de vacinas. O PL 12/2021 é a matéria mais avançada sobre o assunto. De autoria do senador Paulo Paim (PT/RS), o PL aguarda deliberação do Senado sobre as alterações aprovadas na Câmara dos Deputados.

CPI da Pandemia

Em 27 de abril, o Senado Federal instalou a comissão parlamentar de inquérito (CPI) que vai investigar as ações do governo e o uso de verbas federais na pandemia de covid-19. A pressão pela investigação cresceu com a escalada de mortes causadas pela covid-19 no Brasil, ao mesmo tempo em que diversos países vivem uma melhora na situação. Dados do fim de março mostram que o Brasil concentrava um terço das mortes diárias por covid no mundo, mesmo com apenas 3% da população mundial.

As investigações são realizadas pela comissão a partir de dois principais eixos:

  • Apurar as ações e omissões do Governo Federal no enfrentamento da Pandemia da Covid-19 no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes internados.
  • Apurar as possíveis irregularidades e ilícitos que envolvam recursos repassados pela União a Estados e Municípios para o enfrentamento da Pandemia de Covid-19.

Nos primeiros meses de trabalho, a Comissão investigou, principalmente, questões relacionadas à atuação do governo federal durante a Pandemia. Foram convocadas testemunhas para tratar de suposto “gabinete paralelo”, que orientaria o presidente Bolsonaro quanto a defesa de medidas que estão em desacordo com as defendidas pela OMS e por outras entidades da saúde. É o caso do chamado “tratamento precoce”. Investigados de compor o gabinete negaram a existência de qualquer grupo como este e médicos defensores do tratamento precoce defenderam que o médico tem autonomia para indicar os medicamentos que achar mais convenientes para cada paciente.

Outro ponto de investigação da CPI foi a aquisição de vacinas. O Presidente regional da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo, afirmou em testemunho que os primeiros contatos da empresa com o governo brasileiro para apresentação de seu imunizante aconteceram entre maio e junho de 2020. Ele também declarou que a empresa chegou a oferecer, na segunda e na terceira propostas apresentadas ao Ministério da Saúde em agosto do ano passado, 1,5 milhão de doses para serem entregues ainda em 2020, o que não ocorreu por falta de resposta governamental.

Mais recentemente, a vacina Covaxin tomou conta da pauta da CPI e resultou inclusive na suspensão do contrato de compra do imunizante. Essa negociação se tornou uma questão política quando veio a público um depoimento de Luis Ricardo Fernandes Miranda, servidor da área de importação do Ministério da Saúde, ao Ministério Público. No depoimento, dado em 31 de março, Luis Ricardo afirma ter sofrido pressão atípica para acelerar os trâmites da Covaxin dentro da pasta.

A negociação entre o governo federal e a Precisa Medicamentos, que intermedia as negociações da Covaxin, já estava no escopo de trabalho da CPI da Pandemia que incluiu seu sócio Francisco Maximiano na lista de depoentes esperados. No entanto, após a revelação do depoimento do servidor, o caso se tornou uma das principais frentes de trabalho da comissão, que ouviu Luis Ricardo e o irmão, o deputado Luis Miranda (DEM/DF).

Na fala à CPI, os irmãos Miranda afirmaram ter relatado o que sabiam a respeito de irregularidades para o presidente Jair Bolsonaro. Além de ter dito que acionaria a Polícia Federal, segundo o relato, o presidente teria relacionado às irregularidades ao deputado Ricardo Barros (PP/PR), ex-ministro da Saúde e líder do governo na Câmara. Foi afirmado também que após avisar o presidente sobre possíveis irregularidades na compra da vacina, o deputado Luis Miranda teria recebido uma oferta de propina para não atrapalhar a negociação.

Senadores governistas acusam a CPI de concentrar as atividades somente nas investigações do governo federal. O senador Eduardo Girão (PODEMOS/CE) é autor de um dos requerimentos de criação da CPI, para garantir a investigação de estados e municípios. Embora tenham sido realizadas oitivas para tratar do tema, especialmente no caso do colapso de Manaus, essa linha de investigação não avançou como as demais.

Nesta semana, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM/MG), leu o requerimento de prorrogação da CPI da Pandemia. Com a leitura, a comissão está oficialmente prorrogada por mais 90 dias e poderá trabalhar até o começo de novembro. O relator da CPI, senador Renan Calheiros (MDB/AL), e outros integrantes opositores do governo defenderam que para além de uma ampliação de prazo, a prorrogação é uma oportunidade de aprofundar as investigações sobre indícios de crimes graves, principalmente diante dos indícios de corrupção e irregularidades nos processos de compra de vacinas e insumos.

Considerações Finais

Após um difícil início, a vacinação no Brasil acabou avançando conforme a expectativa do Ministério da Saúde e segue para o segundo semestre em uma situação mais previsível. Com o avanço das vacinações em outros países, a oferta e demanda dos imunizantes passam a se aproximar e os cenários de disputas por doses torna-se mais ameno. O investimento em saúde seguirá necessário, para lidar com as sequelas que a covid pode deixar a longo prazo.

A situação econômica do país também apresentou melhoras e dados do Ministério da Economia afirmam que o país já retomou aos parâmetros econômicos anteriores à pandemia. Assim, o governo retoma a sua agenda de reformas e defende que para a concretização de cenário fiscal estável é necessária a aprovação das reformas estruturantes para aumento da produtividade da economia brasileira. Por outro lado, críticos da agenda defendem que cabe ao país a implementação de agenda que permita o desenvolvimento do Brasil e garanta níveis de concorrência com o restante do mundo, que passa atualmente a fortalecer agendas de intervenção estatal para recuperação econômica.

Para além da economia e da saúde, a pandemia também deverá seguir impactando a política brasileira, especialmente na frente liderada pela CPI da Pandemia. Caso a sua prorrogação seja aprovada, a Comissão deverá seguir em sua linha principal de investigação, voltada para as ações do governo federal. Além disso, as ações da CPI também podem refletir nos cenários políticos estaduais, tanto por conta dos investigados em ações voltadas para os estados quanto pela visibilidade que os senadores integrantes da CPI vem adquirindo. Assim, para além do cenário atual, é possível que os reflexos da CPI sejam observados também nas eleições previstas para 2022.

Linha do tempo com acontecimentos entre o primeiro caso de covid-19 no Brasil e a marca de 100 mil doses de vacinas aplicadas em território nacional.

Última Atualização: 15/07/2021

Elaborado pela Equipe da Umbelino Lôbo: Leonardo Nunes, Assessor.

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