A pandemia da Covid-19 continuou a influenciar nas decisões no cenário político em 2021. No âmbito da temática de ciência e tecnologia, a crise sanitária evidenciou a carência de cobertura de internet ao longo do território brasileiro e da necessidade da modernização do setor de telecomunicações e implementação de novas tecnologias para o avanço econômico e social no país.
Por sua vez, a Pasta do Ministério das Comunicações (MCom) se deteve, principalmente, ao Leilão da Tecnologia 5G.O Ministro do das Comunicações, Fábio Faria, havia adiantado que a pauta seria prioridade em sua gestão e que buscaria agilizar o processo de análise do Edital na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e no Tribunal de Contas da União (TCU) para tornar possível o Leilão ainda em 2021.
O Leilão obteve o valor de R$ 49,7 bilhões de reais e possui uma série de obrigações que terão início em 2022. Além disso, o certame também havia sido almejado pelo ex-presidente da Anatel, Leonardo Euler, que enfatizava a necessidade de mudanças institucionais e regulatórias no setor de telecomunicações. O mandato de Euler se encerrou no mesmo dia do leilão de frequências, 5 de novembro, e o cargo ainda aguarda sabatina do Senado Federal. O vice-presidente da Agência, Emmanoel Campelo, assumiu a posição em decorrência da ausência de indicação vinda da Presidência da República.
No âmbito de ciência e tecnologia, destaque-se o esforço para a criação de um marco regulatório sobre Inteligência Artificial (IA). No início de 2021, o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) publicou a Portaria GM 4.617, de 6 de abril de 2021, que instituiu a Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial (EBIA). Em paralelo, o Congresso Nacional aqueceu os debates para o Projeto de Lei (PL) 21/2020, que estabelece princípios, direitos e deveres para o uso de Inteligência Artificial no Brasil.
É importante frisar que apesar do 5G e da IA serem pautas independentes, as temáticas são complementares. Isto é, a Tecnologia 5G irá permitir a maior conectividade entre as máquinas e permitir uma melhor estrutura para a implementação da Inteligência Artificial no país.
Ainda em 2021, vale ressaltar a evolução dos estudos do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações para a criação a vacina brasileira RNA MCTI CIMATEC HDT contra a Covid-19. O estudo de imunizantes conta com pesquisadores nacionais desde o início do seu desenvolvimento e é a primeira vacina com a tecnologia replicon de RNA (RepRNA) a ter um estudo clínico realizado no país. Os testes da vacina estão na primeira fase com objetivo de avaliar a segurança, imunogenicidade e a reatogenicidade (possível reação adversa no organismo).
Para 2022, a expectativa é que as discussões no âmbito de tecnologia continuem a permear as temáticas da tecnologia 5G e de inteligência artificial. Para o 5G, é esperado que o governo monitore a implementação das obrigações impostas pelo Edital às empresas vencedoras. O primeiro compromisso é a instalação do 5G em todas as capitais brasileiras até julho deste ano. Na esfera de IA, o Projeto de Lei que cria o Marco Regulatório de Inteligência Artificial aguarda leitura no Senado Federal. A matéria é aguardada para dar maior segurança na implementação de IA no Brasil e seguir no avanço da temática junto aos países desenvolvidos.
Ambas as pautas tendem a dar sequência para outros temas, como: computação em nuvem e segurança cibernética. Atualmente, há uma preocupação voltada à segurança cibernética e a proteção de dados devido à falta de um plano estratégico robusto de segurança para evitar o aumento exponencial dos ataques cibernéticos com a implementação das novas tecnologias.
PERSPECTIVAS
Tecnologia 5g
A licitação das radiofrequências de 700 MHz, 2,3 GHz, 3,5 GHz e 26 GHz arrecadou R$ 49,7 bilhões e, segundo as obrigações do Edital, cerca de 90% do valor será investido pelas empresas vencedoras em cobertura de rodovias, cidades e localidades. Nesse sentido, R$ 7,4 bilhões do montante arrecado são de outorga, isto é, o direito de exploração. Uma parte do ágio será convertido em novos compromissos de investimento.
As outorgas possuem a finalidade de garantir investimentos no setor de telecomunicações para solucionar as deficiências de infraestrutura; modernizar as tecnologias de redes; e massificar o acesso a serviços de telecomunicações do país.
Nesse sentido, em 2022 começará o início da implementação da tecnologia 5G no país. Entre as obrigações do Edital, está previsto que as empresas vencedoras deverão oferecer tecnologia 5G em todas as capitais e o Distrito Federal até 31 de julho de 2022. O cronograma do Ministério das Comunicações de implantação da tecnologia se estende para as demais cidades até 2029.
O MCom informou que 12 capitais já atualizaram suas legislações locais de infraestrutura de telecomunicações para receberem a nova tecnologia: Brasília, Curitiba, Florianópolis, Fortaleza, Natal, Palmas, Porto Alegre, Rio de Janeiro, São Paulo, Vitória, Aracaju e Boa Vista. As outras 15 capitais brasileiras estão parcialmente adequadas ou estão em processo de atualização de suas legislações municipais.
A Lei Geral das Antenas (Lei Nº 13.116/2015) e o Decreto Nº 10.480/2020 abrangem todas as capitais e municípios para autorizar que ocorra a implementação da tecnologia 5G. Contudo, é indicado que os municípios atualizem suas normativas para ocorrer a disponibilização de antenas com maior celeridade e, consequentemente, a implementação acelerada da tecnologia 5G.
Para além das capitais, o Edital do 5G estabeleceu compromissos às empresas que deverão levar acesso à internet com tecnologia 4G ou superior para regiões pouco ou não atendidas no país. O cronograma do governo federal prevê que as cidades com mais de: 500 mil habitantes recebam a tecnologia até julho de 2025; 200 mil habitantes até julho de 2026; 100 mil habitantes até julho de 2027; e 30 mil habitantes até julho de 2028.
Entre as obrigações previstas, estão:
- implementar internet 4G para as rodovias do país;
- migrar o sinal da TV parabólica para liberar a faixa de 3,5GHz para o 5G;
- construir uma rede privativa de comunicação para o governo federal;
- instalar internet móvel com alta qualidade às escolas públicas de educação básica.
O Edital da Anatel também prevê o compromisso para a implementação de redes de transporte em fibra óptica na Região Norte com o Programa Amazônia Integrada e Sustentável (PAIS). Neste mês, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, realizou uma visita técnica com comitiva de lideranças do Governo Federal, parlamentares, iniciativa privada e servidores do governo, em Macapá (AP), para verificar a implementação da Infovia 00.
Dessa forma, o cabo de fibra óptica subfluvial levará internet de alta velocidade e irá conectar as cidades da região norte do país. A previsão é que a implantação da rede seja concluída até 31 de janeiro com objetivo de conectar instituições de ensino e pesquisa, hospitais, centros de saúde e unidades do poder judiciário.
Outro destaque é que a Agência Nacional de Telecomunicações ampliou suas funcionalidades para o acompanhamento das obrigações das operadoras para a implementação do 5G. Isto é, o site da Agência terá uma área reservada para conferir se as empresas vencedoras do leilão estão cumprindo a obrigação de fazer (multas convertidas em compromissos de investimento); as regras do Edital do 5G; e os compromissos do Plano Geral de Metas de Universalização (relativos à concessão de telefonia fixa).
No âmbito institucional, com o encerramento do mandado do ex-presidente da Anatel, Leonardo Euler, o superintendente de Gestão Interna da Informação da agência, Raphael Garcia, assumiu o cargo como presidente substituto com encerramento em 23 de janeiro. Dessa forma, o vice-presidente da Agência, Emmanoel Campelo, assumiu a presidência em decorrência da ausência de indicação vinda da Presidência da República.
O nome de Raphael constava de lista tríplice de 2020, que possui validade de dois anos. Por conta do prazo, é aguardado a publicação de decreto presencial indicando um nome para ocupar o cargo de forma interina na Agência.
Além disso, há expectativa de sabatina pelo Senado Federal, no mês de fevereiro, da indicação dos nomes de:
- Carlos Manuel Baigorri, para o cargo de presidente do Conselho Diretor;
- Artur Coimbra de Oliveira, para membro do Conselho Diretor, na vaga aberta pela saída do próprio Baigorri.
Apesar dos avanços na área, o setor de telecomunicações se preocupa com o andamento da implementação da nova tecnologia em 2022. O Brasil ainda conta com uma infraestrutura de telecomunicações deficiente com um alto volume de impostos, quase 40% do preço do serviço são taxas. Especialistas da área defendem a redução das cargas tributárias do setor através das discussões da reforma tributária no Congresso Nacional.
Além disso, mesmo com a obrigação de implementação do 5G em todas as capitais brasileiras, o Edital prevê apenas que seja instalado uma antena a cada 100 mil habitantes. Isso deixa em aberto para as operadoras levarem a nova tecnologia para áreas onde identificarem que seja mais favorável.
Por fim, alguns especialistas do setor de telecomunicações se preocupam com a velocidade que o Leilão do 5G foi realizado. Apesar de julgarem de extrema importância a implementação da nova tecnologia, há o receio de que o Edital pudesse ter sido mais coeso e harmonioso para o alcance do 5G por todo o território do país. Outra crítica deve-se a aproximação das eleições presidenciais no Brasil e a propensão da celeridade da realização do Leilão do 5G ter sido realizado como um instrumento de campanha eleitoral.
Inteligência Artificial
A regulamentação da Inteligência Artificial no Brasil é um dos princípios da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), na qual o Brasil é signatário. Desde 2017, o Brasil requisita a entrada para a Organização, o país tem realizado diversos esforços para se alinhar aos requisitos dos países-membros da OCDE. Esse mês, a Organização anunciou aprovação ao convite para Brasil começar a negociar entrada na entidade.
Dessa forma, a regulação da IA é algo recente em diversos países no globo. O Brasil tem realizado esforços para criar uma regulamentação nos moldes da União Europeia e nos Estados Unidos da América através de uma composição de normativas que integrem uma estratégia nacional.
Nesse contexto, em 09 de abril, foi publicado no Diário Oficial da União, a Portaria Nº 4.617, de 6 de abril de 2021, que institui a Estratégica Brasileira de Inteligência Artificial (EBIA) com objetivo de conduzir as ações brasileiras no desenvolvimento das ações e uso ético na área da Inteligência Artificial (IA).
A Estratégia, apresentada pelo MCTI, buscará contribuir para a elaboração de princípios éticos voltado ao desenvolvimento e uso de IA responsáveis; promover investimentos em desenvolvimento e pesquisa em IA; remover barreiras à inovação em IA; capacitar e formar profissionais; e promover ambiente de cooperação entre os entes públicos e privados, a indústria e os centros de pesquisas para o desenvolvimento da Inteligência Artificial.
Há um esforço e uma pressão, principalmente após o Leilão da Tecnologia 5G, de uma construção pelo Poder Executivo com os demais Poderes e sociedade civil para a regulamentação da inteligência artificial de forma transparente, ética e com segurança jurídica. A estratégia brasileira busca seguir os moldes da legislação de IA na União Europeia, na qual debateu por três anos a regulamentação e teve como premissa central a hierarquização dos riscos oferecidos por sistemas e tecnologias que usam Inteligência Artificial.
No âmbito do Poder Legislativo, espera-se a leitura, em 2022, no Senado Federal do Projeto de Lei (PL) 21/2020, que estabelece princípios, direitos e deveres para o uso de inteligência artificial no Brasil. A matéria busca trazer maior segurança digital e gerenciamento de riscos com as novas tecnologias.
O PL foi aprovado em setembro de 2021 pela Câmara dos Deputados, por 413 votos favoráveis e 15 contrários. A relatora do projeto na Casa e presidente da Frente Parlamentar Mista da Inteligência Artificial, deputada Luisa Canziani (PTB/PR), destacou que aguarda a análise do projeto no Senado em 2022 devido a importância da temática para a economia do país. Além disso, ressaltou que a matéria será uma de suas prioridades.
Durante as discussões do projeto na Câmara dos Deputados, a proposição sofreu críticas por estudiosos por tentar regular com rapidez uma temática ainda recente no âmbito internacional. Seguindo a inspiração da União Europeia, a IA no bloco lançou o documento Artificial Intelligence Act (Lei de Inteligência Artificial) que foi fruto de quase de três anos de estudos e debates sobre a temática. Os especialistas brasileiros enfatizaram que o PL 21/2020 precisa ser aprovado com cautela e em um prazo maior. Além disso, ressaltaram que a apreciação à matéria não pode ser apressada devido a pontos sensíveis como: questões éticas, direitos humanos e fundamentais, e questões legais pela responsabilização por danos à terceiros.
Tendo em vista a IA como uma extensão da tecnologia 5G, é esperado que haja pressões para o Senado Federal começar a tramitação da matéria na Casa. Contudo, espera-se uma cautela maior dos senadores para a apreciação da redação da forma como foi aprovada pela Câmara dos Deputados. Isso é devido à contemporaneidade da temática e da preocupação aos governos internacionais por conta da segurança de dados e de ataques cibernéticos. Além disso, o texto do PL 21/2020 sofre o risco de poder ficar desatualizado em um curto espaço de tempo, ano a dois anos. Isso poderia contribuir para indivíduos ou empresas, posteriormente, conseguissem escapar de qualquer responsabilização jurídica.
Boletim atualizado em 31/01/2022
Elaborado pela Equipe da Umbelino Lôbo: Jéssica Coneza, Assessora.