A reformulação do sistema tributário baseado na unificação de impostos e simplificação do sistema de arrecadação foi uma das prioridades anunciadas pela equipe econômica no início da gestão do Presidente Jair Bolsonaro em 2019. Desse momento até hoje, o governo avançou e recuou algumas vezes nas promessas de envio de propostas que concretizassem seus planos.
Inicialmente, a reforma estava concentrada na análise de duas propostas de emenda à Constituição (PECs 45 e 110/2019) e um projeto de lei (PL 3887/2020). Até o final de 2020, a intenção era que a Câmara dos Deputados e Senado Federal analisassem apenas um texto principal, consolidado, na forma de PEC, que seria o resultado dos trabalhos de uma Comissão Mista Especial.
Entretanto, os debates relacionados à reforma tributária ganharam outra dinâmica a partir da eleição de Arthur Lira (PP/AL) e Rodrigo Pacheco (DEM/MG) para presidirem, respectivamente, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, em fevereiro/2021. Dessa forma, em maio/2021, foi firmado acordo entre o Congresso Nacional e a equipe econômica, para a análise fatiada da reforma pelas Casas Legislativas. A Câmara dos Deputados será responsável por analisar o conteúdo infraconstitucional da reforma e ao Senado caberá a deliberação da parcela constitucional, além de proposta de renegociação de dívidas (Refis).
PODER EXECUTIVO
As duas propostas de autoria do Poder Executivo foram encaminhadas inicialmente para a análise da Câmara dos Deputados. Os projetos propõem alterações em impostos federais diante do cenário de dificuldade de se construir maioria para aprovar uma mudança mais ampla envolvendo tributos de competência de entes subnacionais.
PROJETO DE LEI (PL) 3887/2020 – CBS (íntegra)
Apresentado em julho/2020, foi a primeira “fatia” da proposta de reforma elaborada pelo Poder Executivo e encaminhada ao Congresso Nacional. O projeto Institui a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). O novo tributo seria resultante da unificação do PIS e da Cofins, com alíquota de 12%.
Principais pontos da proposta:
- Manutenção da isenção tributária para itens da cesta básica, sobre serviços de saúde custeados pelo SUS, sobre serviços de transporte coletivo de passageiros e para entidades beneficentes de assistência social e templos religiosos.
- Isenção do pagamento da CBS para condomínios de proprietários de imóveis, instituições filantrópicas e fundações, entidades representativas de classes e conselhos de fiscalização de profissões, serviços sociais autônomos, sindicatos e partidos políticos.
- Manutenção do regime monofásico para os setores de combustíveis e cigarros.
- Menor alíquota da CBS para bancos.
STATUS E CENÁRIO:
O despacho da matéria determina a instalação de Comissão Especial para avaliação de mérito da proposta. Entretanto, manifestações recentes do Presidente da Câmara apontam para a deliberação da proposta diretamente no Plenário da Casa em outubro. A matéria é relatada pelo deputado Luiz Carlos Motta (PL/SP) e é aguardada a apresentção do seu relatório.
PROJETO DE LEI (PL) 2337/2021 – IMPOSTO DE RENDA (íntegra)
A segunda fase da reforma tributária proposta pelo Poder Executivo foi apresentada ao Congresso Nacional em 25/06 e trata de mudanças no imposto de renda para pessoas físicas, empresas e investimentos. O projeto tramitou em regime de urgência e foi aprovado no início de setembro pelo plenário da Câmara dos Deputados. O cenário de divergências foi superado por meio do apoio maciço da oposição e pela negociação direta de Lira com os parlamentares.
No Senado Federal, a matéria deverá ser analisada pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) e plenário.
SENADO FEDERAL
No Senado, a principal proposta de reforma tributária em tramitação é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 110/2019. Também ficaram sob a responsabilidade da Casa a análise inicial de propostas legislativas que dizem respeito à ampliação de prazo para refinanciamento (Refis) e/ou renegociação de dívidas de pessoas jurídicas.
PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO (PEC) 110/2019 – IBS (íntegra)
A matéria propõe a criação um Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), nos moldes dos impostos sobre valor agregado, em substituição a nove tributos (IPI, IOF, PIS, Pasep, Cofins, CIDE-Combustíveis, Salário-Educação, ICMS, ISS).
Principais pontos da proposta:
- O IBS seria um tributo estadual, instituído por intermédio do Congresso Nacional, com poder de iniciativa reservado, basicamente, a representantes dos Estados e Municípios.
- A alíquota do IBS seria fixada por lei complementar. Previsão de existência de uma alíquota padrão; poderão ser fixadas alíquotas diferenciadas em relação à padrão para determinados bens ou serviços. A alíquota, portanto, poderia diferir, dependendo do bem ou serviço, mas seria aplicada de maneira uniforme em todo o território nacional.
- A PEC 110/2019 autoriza a concessão de benefícios fiscais (por lei complementar) nas operações com alimentos, inclusive os destinados ao consumo animal; medicamentos; transporte público coletivo de passageiros urbano e de caráter urbano; bens do ativo imobilizado; saneamento básico; e educação infantil, ensino fundamental, médio e superior e educação profissional.
- Consoante o texto da PEC, o produto da arrecadação do imposto é partilhado entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios segundo o método previsto nas regras constitucionais descritas no novo texto constitucional proposto na Emenda, ou seja, mediante entrega de recursos a cada ente federativo conforme aplicação de percentuais previstos na Constituição sobre a receita bruta do IBS (repasse de cota-parte).
- A PEC prevê que durante um ano seria cobrada uma contribuição “teste” de 1%, com a mesma base de incidência do IBS, e, depois, a transição duraria cinco anos, sendo os atuais tributos substituídos pelos novos tributos à razão de um quinto ao ano (os entes federativos não podem alterar as alíquotas dos tributos a serem substituídos).
- No concernente ao período de transição, a PEC 110 prevê um prazo final de quinze anos. A partir da criação dos novos impostos, cada ente federativo (União, cada Estado, Distrito Federal e cada Município) receberia parcela das receitas dos impostos novos de acordo com a participação que cada um teve na arrecadação dos tributos que estão sendo substituídos. Após a implementação definitiva do novo sistema de cobrança, prevista para durar 5 anos, a regra retro descrita seria progressivamente substituída pelo princípio do destino, à razão de um décimo ao ano.
- Sobre o Imposto Seletivo, a PEC 110 prevê a cobrança obre operações com petróleo e seus derivados, combustíveis e lubrificantes de qualquer origem, gás natural, cigarros e outros produtos do fumo, energia elétrica, serviços de telecomunicações a que se refere o art. 21, XI, da Constituição Federal, bebidas alcoólicas e não alcoólicas, e veículos automotores novos, terrestres, aquáticos e aéreos.
STATUS E CENÁRIO:
Atualmente, a proposta está pendente de deliberação de parecer na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), onde é relatada pelo Senador Roberto Rocha (PSDB/MA). Ele chegou a apresentar, ainda em 2019, primeira versão de seu parecer. A íntegra do relatório pode ser acessada por meio desse link.
Por englobar tributos estaduais e municipais, a conformação política para votação da matéria é mais delicada, pois há divergências entre os estados e municípios sobre as propostas.
Apesar de o Ministro Paulo Guedes resistir a uma proposta de reforma ampla, envolvendo tributos nacionais e subnacionais, as negociações têm avançado. A PEC é apoiada por grande parte da iniciativa privada e por gestores estaduais. Há setores que defendem, inclusive, que a reforma do Imposto de Renda seja endereçada no âmbito da PEC 110/2019.
O relator tem afirmado que seu parecer seguirá a mesma linha do relatório do Deputado Aguinaldo Ribeiro (PP/PB) apresentado no âmbito de Comissão Mista que foi criada com a finalidade de consolidar um texto de consenso entre Câmara dos Deputados e Senado Federal para a reforma tributária. Também no sentido de reformar o sistema tributário, tramita na Câmara dos Deputados a PEC 45/2019, que converge com a proposta em análise pelo Senado ao determinar a extinção de tributos que incidem sobre bens e serviços. A PEC 45, no entanto, não deve avançar por divergências políticas entre Lira e Aguinaldo Ribeiro, que a relatava na Câmara.
REFIS
Há dois projetos em tramitação no Congresso Nacional que versam sobre o parcelamento de débitos com a União.
O Projeto de Lei (PL) 4728/2020. de autoria do Senador Rodrigo Pacheco (DEM/MG), e propõe a modificação do Programa Especial de Regularização Tributária (Pert), com novos prazos e condições para o pagamento de débitos com a União; e o Projeto de Lei Complementar (PLP) 46/2021, de autoria do Senador Jorginho Mello (PL/SC), que institui o Programa de Renegociação em Longo Prazo de débitos para com a Fazenda Nacional ou devidos no âmbito do Simples Nacional (RELP).
Ambas as propostas foram aprovadas no início de agosto pelo Senado Federal e agora aguardam deliberação na Câmara dos Deputados.
O Governo, todavia, é contrário ao “modelo puro” e amplo de Refis. A intenção da equipe econômica é trabalhar para que o projeto preveja um programa de transação tributária, que analisa o caso de cada empresa antes de renegociar as dívidas tributárias. A intenção do Ministério da Economia é trabalhar para ajustes no conteúdo das propostas e limitar o alcance às dívidas contraídas durante a pandemia de Covid-19.
A perspectiva é que os projetos sejam analisados diretamente no Plenário da Câmara e votados rapidamente.
Última atualização: 23/09/2021, às 17h.
Artigo publicado em 30/08/2021.
Elaborado pela Equipe da Umbelino Lôbo: Luisa Araujo, Sócia e Gerente de Relações Governamentais.